O universo dos relacionamentos binacionais ainda é desconhecido dos brasileiros. Como adaptar a cultura, história, língua?
O universo dos relacionamentos binacionais ainda é desconhecido da maioria dos brasileiros e de cidadãos de outras nacionalidades. Envoltas em falso glamour, sonhos de princesa, príncipes e viagens internacionais, muitas dessas uniões exigem demasiadamente de um dos cônjuges ou de ambos. Em geral desavisada, uma das partes deverá mudar totalmente de vida e reiniciar em outro país. Relacionar-se com alguém de outra nacionalidade significa, em algum momento, que um dos dois experencie a migração.
O livro-reportagem Amores Internacionais: “Casei com um estrangeiro, e agora?”, da jornalista Liliana Tinoco Bäckert, aborda inúmeros cenários possíveis da escolha de unir-se a alguém de um outro país de cultura diferente. Lançado em novembro deste ano pela Editora Inverso, o título expõe dores, riscos e alegrias dessas relações.
Como jornalista, a autora tem a habilidade com a comunicação, mas como mulher e imigrante, os olhos e o coração são certamente ainda mais sensíveis ao tema, já que também é casada com um estrangeiro.
A VP Dicas é uma empresa especializada em imigração com mais de 60 mil seguidores, e naturalmente, também conhece muitas histórias incríveis de imigrantes que sonham em casar com alguém de outra nacionalidade e ter um “final feliz”. Inclusive, várias dessas histórias realmente chegam ao casamento. Sabem disso, porque muitas delas são clientes e as ajudam na questão jurídica. Outras histórias ficam a saber através de relatos no Grupo Fechado do Facebook voltado para debate do assunto imigração.
Por causa do tema tão relevante, convidamos a autora para um bate-papo com a finalidade de entender um pouco desses vínculos binacionais.
Em primeiro lugar, a minha história pessoal. Entretanto, a minha curiosidade e a incessante busca me chamaram a atenção para a escassez de material sobre o tema. Eu trazia inúmeros questionamentos, notava que as minhas amigas, também casadas com estrangeiros, vivenciavam conflitos semelhantes com seus maridos e não conseguiam entender os porquês para muitas questões cotidianas.
As informações sobre relacionamentos de nossas conterrâneas na mídia nacional com estrangeiros eram sempre sobre estereótipos, do tipo “gringo se apaixona por brasileira na praia”.
Mas eu queria saber mais, entender onde estavam as diferenças e porque age-se de uma maneira e não de outra.
Esse é o fator interessante da apuração de dados, talvez a parte mais divertida e gratificante do processo como um todo. Comecei por colocar anúncios em diversos grupos de redes sociais de brasileiros pelo mundo dizendo que eu procurava mulheres brasileiras casadas com estrangeiros.
Eu queria, com isso, conhecer histórias de vida de pessoas que eu nunca tinha visto antes. O objetivo era navegar em mares totalmente desconhecidos.
Entrevistei várias, frutos dessa busca. A delícia dessas conversas era a caixinha de surpresa - vivências às vezes felizes outras vezes muito tristes – que vinham sem eu ter ideia.
Outras histórias chegaram de forma informal mesmo, em um bate-papo com uma amiga, a conhecida da amiga que conta um caso, pessoas que eu sabia que tinham uma experiência específica, por exemplo.
Algumas indicações de candidatas à entrevista tiveram um quê de inusitado. Teve gente até que, ao conversar com um taxista, descobria por um acaso que tinha uma parente que vivia com um estrangeiro, pegava o contato e me passava.
Sim, existe. O autor Dugan Romano, autor de livro sobre o tema em inglês, traçou algumas personalidades que se encantam com o exótico. Resumidamente, ele relata que essas pessoas se revelaram mais aventureiras, não convencionais, com um espírito mais livre e emocionalmente mais estáveis do que a média das mulheres de casais da mesma nacionalidade.
Em diversos textos, autores afirmam que em famílias cujos filhos são estimulados a viajar ou estudar fora, por exemplo, há mais contato com culturas estrangeiras e maior probabilidade de se unir a uma pessoa de fora.
Há aquelas pessoas que querem se libertar da própria cultura, outras que vêm de famílias com pais ausentes, por exemplo. O resultado é que se sentem atraídos por pessoas de culturas com outras definições de famílias.
É fato em muitos casos. Precisamos nos lembrar de que o Brasil é um país enorme, cheio de discrepâncias sociais.
Para algumas dessas mulheres, talvez um marido “gringo com dólar” seja a única luz no fim do túnel. E às vezes, é mesmo.!
Se levarmos em consideração que, em uma pesquisa respondida por 1.470 profissionais brasileiros em 2019, 91% diziam que teriam vontade de trabalhar no exterior, temos aí a resposta de que a vida fora do Brasil exerce um fascínio em muitos de nós.
O problema é que embarcar nesse glamour de qualquer maneira pode trazer muitos problemas. Muitos vão morar fora sem nenhum preparo para tal empreitada e sofrem muito desnecessariamente ou se arriscam a se relacionar com um agressor.
No seu livro, você cita 35 perfis de casais interculturais e conta suas histórias. Então por favor, poderia nos explicar:
A adaptação de um adulto a uma nova cultura, em geral, é um processo difícil. Mas tudo depende da sociedade para a qual a pessoa precisa vivenciar e o quão diferente e flexível essa pessoa se apresenta. Cada cultura tem seu grau de dificuldade em alguns quesitos, e outros pontos de facilidade. É bem complexo.
A maneira como a família desse marido/esposa receberá esse estrangeiro também conta. A migração exige uma competência para lidar com o diferente. E o casamento binacional também. Dessa maneira, é um caminho de duas mãos: marido, mulher e família precisam contribuir.
Diferenças Culturais - São inúmeros e atingem de acordo com a camada social no Brasil. Em geral, a falta de conhecimento das diferenças culturais e querer que esses homens ajam de uma forma brasileira.
Educação - O baixo nível educacional que dificulta em aprender o idioma do país onde irá morar pode comprometer o bem estar desse migrante. Sempre bato na mesma tecla: “língua é poder”.
Trabalho - Para as mais estudadas, a barreira em entrar no mercado de trabalho. Isso coloca um peso muito grande no relacionamento, que pode ganhar a fama de bloqueador de suas carreiras.
Cada país tem seu sistema. Mas acredito que o Consulado brasileiro possa ajudar, grupos na internet de brasileiros vivendo no país específico, e, claro, a polícia, em caso de ameaça de violência.
Sabemos que Liliana Tinoco Bäckert é carioca, e vive desde 2005 na Suíça com sua família, o marido e dois filhos. Como você também é casada com um estrangeiro, então poderia nos falar:
Para mim foi muito difícil no início. Saí de uma cidade grande como o Rio de Janeiro e me mudei para um vilarejo na Suíça. Tive que aprender o alemão, deixei amigos, profissão, o sol, tudo para trás. Mas o fiz por um amor e o fato de o meu marido ter sido compreensivo ajudou muito, o que não acontece com todas. Preciso deixar isso claro. O estudo do assunto veio, para mim, como terapia, uma forma de entender o entorno e de me compreender nesse contexto. Mas foi maravilhoso, apesar de tudo. Porque todo esse processo me tornou melhor e não me arrependi de ter tomado a decisão de me casar. Já são 16 anos nessa estrada juntos.
Claro.
E de resto, não há regra definida.
O que vale mesmo é o amor, o respeito e a beleza da vida. Aproveite!
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